segunda-feira, 4 de julho de 2011

Giramundo


                Passar a vida numa roda viva é rotina para quem sente. Somos todo sensibilidade, milhões de receptores espalhados pelo corpo, nos dando a sensação de movimento, espaço, prazer, dor, perigo, medo, fuga, alegria. É muita coisa para processar, com tanta coisa nos bombardeando ao redor, pelos olhos, nariz, ouvidos, boca e tristemente escorregado pelas mãos.
                Aprendemos, então, a viver seletivamente. As sensações nos guiam e nos desviam e, vez ou outra, nos convencemos que aquilo sentido motiva a razão de agir. Tornamo-nos verdadeiras máquinas de amar ou odiar. Viramos tratores ou fontes infindáveis de lágrimas em posição estática. Destruímos canteiros, construímos muros e vamos vivendo, sentindo mais ou menos. Crescemos às tapas. Reagimos a tudo, cada um do seu jeito, até que o menino vira homem, o filho vira pai, o presente vira ontem e o que era para acabar parece não se esgotar mais.
                Sentir, sentir, sentir: eis um fardo que alguns talentosamente conseguem suprimir, sem, no entanto, dar-se conta que se tornam frios, confusos, distantes e, mais tarde, dormentes. A analgesia tão esperada nos é dada ao luxo, quando adultos, seja ela naturalmente esculpida pelo orgulho, ou artificialmente pelos benzodiazepínicos e anti-depressivos. Nossas tristezas medicalizadas, nossos sonhos fabricados, nossa existência em um quadro de Frida. Todos damos o nosso jeito de tudo passar e cavamos nossos fossos e criamos jacarés.  Alguns correm, outros escrevem, outros cantam, outros malham, outros se escondem até que a verdade indubitavelmente lhe assalta no meio da noite, roubando-lhe o travesseiro.
                Qual a saída? Apenas sinta... Mas isso requer coragem. Há quem diga que sentir é primitivo, irracional. Porém, eu mesmo acho que a razão é o nosso próprio abismo. Quanto mais nos agarramos a ela, mais somos engolidos e tudo mais foge da luz. Somos claramente sujeitos escuros, mas eu nasci para ser feliz. Acredito que todo mundo também. Que tenhamos a sorte de encontrar nossa própria substância. O resto é arte e alquimia...

                [O problema todo, é que você não se entende, meu bem.
E, sinceramente, nem eu me entendo também.]

Angelo A. P. Nascimento

3 comentários:

Vanessa Souza disse...

E quem é que se entende?

Ricardo Cambraia disse...

eu sou todo medicamentos...

Ricardo Cambraia disse...

Somos claramente sujeitos escuros, mas eu nasci para ser feliz. ----muito bacana. abraços!

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