sábado, 19 de junho de 2010

Eita, vida pesada!


            Experimento as incompreensões das orelhas que não escutam e da minha língua que parece falar errado. Restam-me os dedos, para discorrer sobre o ontem e o presente. Restam-me as mãos para palavrear as dores da sensação desse descontrole que a minha vida descarrilou afora.

            A quem eu peço ajuda? Rodeio-me de cadernos, livros, pesquisas e de uma ventania desajeitada. Proteção? Andar na ponta dos pés, vinte e quatro horas do dia, para não incomodar, é proteger-se? Será que falseio meu anseio de passar despercebido?

            Careço de colo e de quebras de silêncio. Preciso de mãos nos meus cabelos e de cuidados. Ando ferido, cansado, como se estivesse contrariando o que a vida toma por certo. Sinto-me como estrangeiro e secundário nas minhas próprias terras. Tento abrir portas com maçanetas que emperram. Há ferrugem nas minhas emoções.

            Eu quero um descanso de mim, de salvar o mundo e matar leões alheios. Quero ser resgatado da torre que continuamente se eleva e me afasta do chão. Quero apenas uma chance de chorar, uma oportunidade do luxo de fraquejar e poder me apoiar.

            Agora mesmo, não sei qual caminho se estende a frente e encosto-me em mim mesmo, como se, perdido, pudesse me içar do meio de minhas próprias palavras. Mas eu não me enxergo nelas. Vaidosas, elas serpenteiam por entre tantos. Eu sou mais um que se dilui.

            Quero ser entendido.

            Quero, hoje, ser humano.

            (Lá vem a chuva!)

Eita, vida pesada....

Angelo A. P. Nascimento

7 comentários:

Hugo de Oliveira disse...

passando pra te desejar um ótimo final de semana...de paz.


abraços


Hugo

Pâmela Grassi disse...

Angelo! Adorei este espaço. A maneira como discorre as palavras sobre o texto é fantástica!

"Restam-me as mãos para palavrear as dores da sensação desse descontrole que a minha vida descarrilhou afora." Restam as palavras descontroladas quem se despedem das mãos pelas pontas dos dedos!

Muito bonito! Encanto que encanta!

abraços

Átila Goyaz disse...

Muito bem escrito, parabéns pelo texto!
Abraços!

Vanessa Souza disse...

A leveza é um dom. No entanto...

"Das várias formas possíveis de infelicidade, me parece mais aflitiva não é necessariamente a que mais dói. Muito mais trágico me parece o destino de quem atravessa a vida sem se molhar, como se os efeitos (felizes ou nefastos) escorressem sobre a pele como água sobre as plumas de um pato. Com seus altos e baixos, imagine nossa vida como uma breve passagem por um circuito de montanhas- russas. Quem atravessasse a experiência anestesiado, sem gritos, pavor e risos, teria jogado fora o dinheiro do bilhete. Tenho a ambição, ao contrário, de ajudar meus pacientes a viver de tal forma que, chegando o fim, eles possam dizer-se que a corrida foi boa".

(Cartas a um jovem terapeuta, Contardo Calligaris, p. 152)

Unknown disse...

Tu escreves como um homem comum. Não como aquele homem de sonhos, de imaginação recém criada.

Levanta-te, meu caro!


Muito obrigado pelo último comentário e pelo selo. Sinto-me honrado. Hehehe...

Unknown disse...

Angelo!!!

Tu me prende!
Tuas emoções também!
Gosto muito do jeito como escreve e descreve. Também me traduz!

A gente faz mesmo muitos castelos, e as vezes nos trancamos em nossas proprias torres!

Abração!


p.s. muito obrigado pela indicação, fiquei tri honrado! VALEU!!

Ricardo Cambraia disse...

e eu quero te falar uma coisa: eu deixei de ter esperanças, pq é um terrível sofrimento. me perdoe por estar lhe dizendo isso, mas não, não posso viver de esperanças [ estou falando por mim] e mais uma vez fui levado a este pensamento a ler seu texto. me desculpe por ser cético e talvez duro no que eu te falo. desconsidere se for preciso. esperanças de consertar o mundo , de mudar pessoas, de principalmente nos mudar. o que pudermos fazer é válido, mas sem a mentalidade " eu fiz a minha , a nossa parte", pq é o mesmo que lavar as mãos. Dê o melhor de si, dentro de suas condições porque isso é se dar a condição de ser humano. é o que precisamos... um abraço e me desculpe novamente.

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